Num testemunho comovente, católicas e católicos gays reiteram a sua fé na igreja
Entre as celebrações em torno do mês do Orgulho, um painel de católicos LGBTQ+, realizado no passado dia 26 de junho, lembrou a uma plateia de cerca de 100 pessoas que o preconceito e a violência ainda confrontam as suas comunidades um pouco por todo o mundo. O painel, patrocinado pelo Departamento de Teologia da Universidade de Fordham e pela Igreja de São Francisco Xavier, prestou homenagem ao 50.º aniversário do levantamento de Stonewall através de lembretes resolutos de que a violência e o isolamento ainda ameaçam globalmente as católicas e os católicos LGBTQ+, mas frequentemente a sua fé permanece firme. Cada um dos elementos do painel da noite era proveniente de países onde os católicos são a maioria. Todas e todos disseram que desejavam escutar mais por parte dos responsáveis da igreja dos seus países que explicitamente condenasse tal preconceito.
Dando Testemunhos por Outras e Outros
SSenfuka Joanita Warry, diretora executiva do Freedom and Roam Uganda, disse que se sentia obrigada a contar a história de outras e outros e não a sua, uma vez que ela tinha tido a oportunidade de viajar para o estrangeiro enquanto a maioria das suas compatriotas lésbicas tinham visto os seus vistos de saída negados.
«Enquanto olho para a multidão contarei o número de mulheres, porque isso é um tema na igreja católica: o facto de as mulheres estarem sempre no banco de trás», disse ela. «Se nos afastarmos dos assuntos as nossas vozes não serão escutadas, mas sempre que aparecemos as nossas vozes são ouvidas».
Ela contou a história da sua companheira, que foi forçada num casamento do qual nasceram três crianças. A sua companheira divorciou-se do marido e começou a namorar com a Warry. As duas estão juntas há sete anos. Embora a Warry ajude a criar as crianças, ela admitiu que é virtualmente impossível para ela estar presente nas atividades escolares ou mostrar-lhes afeto em público, por temer ser chantageada. Ela disse que, apesar das suas discrições, o ex-marido da companheira foi à escola das crianças e falou com os professores sobre a sua relação lésbica. Ela disse que isso não é uma tática rara, o usar as crianças dessa forma.
«No Uganda, uma pessoa não quer que os filhos saibam que se é gay», disse ela. «Não é que mantenhamos, de livre vontade, a nossa relação afastada deles. Mantemos a nossa relação longe deles para os proteger.»
A sua companheira é agora conselheira dessas crianças. Ela mencionou o caso de um filho de uma mulher lésbica que foi descoberta na escola católica da família. O rapazinho sofreu um esgotamento. Noutro caso, uma mulher foi espancada pelo marido depois deste ter descoberto que ela era lésbica. Ela disse que encontrou um refúgio no Freedom and Roam Uganda.
«Eu comecei esta associação para pessoas que nunca quiseram afastar-se da igreja, mas permanecer na igreja», disse ela. «Também acredito no facto de que somos criados à imagem de Deus».
Discernimento como Refúgio
O irmão Argel Tuason, OSB, é um monge oblato beneditino do Mosteiro Sem Muros. Ele falou sobre o seu crescimento nas Filipinas e o facto de antever um sentido de comunidade na igreja católica que sentiu não poder encontrar em qualquer outro lugar. Contudo, recordou igualmente um episódio doloroso de uma tentativa de conversão forçada através de um exorcismo, no qual foi pressionado a renunciar à sua sexualidade.
O irmão Tuason disse que acabou por encontrar consolo através de um «caminho contemplativo» e lendo a obra de John McNeill, SJ, um jesuíta que se destacou como paladino dos direitos dos gays e que ensinou em Fordham. O Pe. McNeill foi autor do livro, publicado em 1976, «A Igreja e o Homossexual», para o qual foi entrevistado por Tom Brokaw, entre outros eminentes protagonistas dos media americanos. Conjuntamente com o Pe. Mychal Judge (o capelão dos bombeiros de Nova Iorque, que se identificou como gay e morreu nos atentados às torres gémeas, em 11 de setembro), o Pe. McNeill criou um centro de ajuda à SIDA, em Harlem. De acordo com o seu obituário no The New York Times, ainda que o Vaticano tenha considerado o livro como teologicamente correto, o Pe. McNeill acabou brigando com o então cardeal Joseph Ratzinger (que viria a ser o Papa Bento XVI) e acabou por ser forçado a abandonar, em 1986, a Sociedade de Jesus.
Encolhendo as lágrimas, o irmão Tuason disse que o acontecimento daquela noite se realizava em «solo sagrado» uma vez que o Pe. McNeill tinha ali ensinado. Ele recorda-se de regressar repetidamente à mesma livraria para ler o seu livro na totalidade, quando se mudou para os Estados Unidos, em 2009, e o dinheiro não abundava. Acabou mesmo por se corresponder com o padre por e-mail.
«Estou verdadeiramente grato por ter tido o privilégio de comunicar com ele e agradecia por aquele livro», disse ele. «Sei que a sua presença está connosco e talvez esteja a sorrir e a celebrar com todas e todos nós.»
Vivendo a Missão
Carlos Navarro, um analista político da Cidade do México, que vive agora em Puerto Vallarta, teve uma jornada comparativamente mais suave em relação aos seus colegas de painel. Ele mantém também uma fé inabalável de que as pessoas são a igreja, não a sua liderança. Citou grupos de jovens junto dos Missionários Espiritanos como sendo a sua fundação espiritual, onde o serviço se funde com a escritura.
«Tive uma experiência maravilhosa com os grupos de jovens», disse ele. «Quando estava no colégio e via aqueles jovens fazer o que faziam e dizer o que diziam por isso era o que Jesus tinha feito e dito».
Agora, depois de mais de 20 anos numa relação, ele casou com o seu parceiro em 2016, quando as uniões entre pessoas do mesmo sexo «ainda estavam frescas na imprensa» devido à sua legalização pelo supremo tribunal do México. Continuou, contando aquilo que observou na sua juventude num grupo LGBT. Tal como os primeiros cristãos, reuniam-se na casa uns dos outros, disse ele. Liam a Escritura e formaram um coro. Um padre local acabou por os convidar para celebrarem a última missa de cada mês. Sem muito alarido o grupo acabou por se juntar à paróquia. Ele disse que não havia grandes dúvidas de que a maioria do coro masculino era gay, mas a paróquia ficou encantada.
«Pensamos que se a igreja católica vai mudar, irá fazê-lo por convicção não por decreto», disse.
Fonte: Fordham News