![Fotografia CNS/Fordham University/Bruce Gilbert Fotografia CNS/Fordham University/Bruce Gilbert]()
«Venho para esta conversa enquanto negro, padre gay e teólogo.»
Esta foi a linha de abertura da conferência do passado dia 4 de julho de Fr. Bryan Massingale proferida por altura do 50.º aniversário da DignityUSA, grupo irmão da Rumos Novos, nos Estados Unidos.
«Não profiro esta conferência porque senti a necessidade de algum anúncio em grande», afirmou ele. «Tal como já afirmei, o título da conferência não é «Padre Sai do Armário» ... Há muitos anos que saí do armário e que sou honesto no que diz respeito à minha sexualidade em relação àquel@s que amo e que me amam. Também, a minha orientação não é «manchete» para muit@s outr@s que me conhecem de forma mais casual».
O título de Massingale para a palestra foi «O Desafio da Idolatria no Ministério LGBTQI» e este título contém a chave para a parte mais profunda da sua mensagem. O que é que a idolatria tem a ver com isto? Tanto quanto Deus tem a ver com isto - e que é tudo.
Foi durante um retiro inaciano em 1982, imediatamente antes da sua ordenação como diácono, à medida que ele meditava na primeira história da criação no Génesis, que ele «reparou que quando a criação estava concluída, não havia uma única pessoa negra. Nem sequer havia qualquer pessoa gay. À medida que contemplava a humanidade, para tod@s aquel@s criad@s à imagem da Deus, não havia ninguém que se parecesse comigo. Ou que amasse como eu. Não havia nada na criação que fosse um espelho meu». Ou, pelo menos, não como anos de educação católica tinham informado a sua imaginação e a sua compreensão de si próprio e de Deus. «A minha própria oração traia o facto de não acreditar nela. Não acreditava que Deus pudesse ser visualizado como negro. Ou como gay. E certamente que não como ambos simultaneamente».
O cerne da sua reflexão merece ser citado na sua totalidade (o sublinhado é de Massingale):
A maior diferença que enfrentamos enquanto pessoas sexualmente minoritárias não é um problema de ética sexual. Temos tendência em pensar, como nos é dito, que os nossos problemas na igreja e na sociedade têm origem na nossa não conformidade com o código moral da igreja.
Porém, a igreja tem uma solução para esse tema. Se pecas, podes ir confessar-te. Recebes perdão e absolvição. ... O nosso maior problema — aquele que nos causa a maior dor, alienação e autoisolamento — é que nos foi contado uma história falsa sobre Deus e nos foram dadas imagens falsas de Deus. Este é o nosso problema.
Subjacente a todas as lutas que suportamos no mundo e a todas as histórias que escutámos durante este encontro — histórias de sermos expulsos de paróquias, ostracizados nas nossas famílias e, no geral, não sermos bem-vind@s — subjacente a todas estas experiências está uma história que o catolicismo conta sobre si mesmo.
No cerne desta história encontra-se o facto de para se ser católicos é necessário ser-se hétero. «Católico» = «hétero». O catolicismo oficial conta uma história onde somente as pessoas heterossexuais, o amor heterossexual, a intimidade heterossexual, as famílias heterossexuais — somente estas podem sem ambiguidades espelhar o Divino. Somente estas pessoas são verdadeiramente sagradas. Genuinamente santas. Somente estas pessoas são dignas de aceitação e respeito sem reservas. Todas as demais pessoas e expressões de amor, vida familiar, intimidade e identidade sexual são sagradas (se alguma vez o são) somente através da tolerância ou da exceção.
De facto, é-nos dito que somos «reflexões tardias» na história da criação e não fazemos parte do plano original. Por outras palavras, somos «filh@s de um deus menor» ... Sim, certamente que temos necessidade de repensar a ética sexual oficial da nossa igreja. Mas mais ainda, temos de repensar Deus.
Imaginem, aquel@s de nós não sobrecarregados por um Deus tão limitado, como teria sido a vida se a nossa aceitação na comunidade católica estivesse dependente da tolerância de outros seres humanos em vez de residir no pressuposto do amor incondicional de Deus por nós. Imaginem se a imagem de Deus dada pelos responsáveis religiosos excluísse um elemento da nossa identidade humana que é intrínseco a quem somos.
A irmã beneditina Joan Chittister, ao falar sobre a evolução do seu pensamento sobre Deus, afirma que aquilo em que acreditamos sobre Deus — o modo como imaginamos Deus — «dá cor a tudo o que fazemos em nome de Deus. Dá forma a tudo o que pensamos sobre o próximo». De facto, sublinha ela, acreditar em Deus não custa muito — aconteceu vezes sem conta ao longo da história. «É o tipo de Deus no qual escolhemos acreditar que, no fim, faz a diferença».
As mulheres, compreensivelmente, fornecem algumas das novas e mais profundas ideias para reimaginar o Deus do cristianismo católico que emergiu de séculos de formulações por uma cultura de segredo maioritariamente masculina e celibatária.
No seu livro Busca pelo Deus Vivo, São José a irmã Elizabeth Johnson escreve que as lutas para compreender Deus através de formas novas emergiu nas últimas décadas devido à variedade de acontecimentos e forças — tal como tentar compreender o mal do Holocausto, um amplo espectro de temas de justiça social e «do encontro da cristandade com a bondade e a verdade nas tradições religiosas mundiais». Aquilo que outrora era território marcado, o monarca (sempre homem) cujas relações com os humanos eram uma série de transações e de fazer o bem e o mal num balanço cósmico, está a ser novamente escrutinado e reconstruído.
«Por idolatria», afirmou Massingale, «quero dizer a crença generalizada de somente as pessoas heterossexuais, os seus amores e relações são o padrão, normativo, universal e verdadeiramente 'católico'. Que somente estas pessoa podem mediar o Divino e conter o sagrado. Que Deus somente pode ser imaginado como hétero».
Isto coloca a conversa num novo espaço. Massingale muda a questão de "A que ética aderes?" para "Qual é o Deus no qual acreditas?"
Fonte: National Catholic Reporter.