Neste tempo do Advento, sei que Deus me aceita como um católico gay. Mas e os outros cristãos?
No verão passado visitei, pela primeira vez, o Museu Nacional de História e Cultura Afro-Americana. Depois de viajar pelas profundezas de uma história marcada pelo trauma e ainda assim alicerçada na superação, sentei-me a refletir na pátio contemplativo à medida em que as águas da fonte caíam.
Estava fascinado por duas citações brasonadas na parede. A primeira, a profecia lírica de Sam Cooke de que "a mudança virá"; a segunda, a declaração bíblica do Dr. Martin Luther King de que "encontramo-nos determinados... a trabalhar e a lutar até que a justiça caia como água e a retidão como uma corrente poderosa."
Neste Advento, o tempo cristão antes do Natal, senti-me levado de volta ao meu tempo no museu e à autorreflexão que ele inspirou. O Advento é um tempo de antecipação e admiração. É um tempo destinado a preparar os cristãos para a aproximação com Deus - a personificação do amor e da justiça e da equidade.
Este tempo é, para mim, simultaneamente sóbrio e alegre - um homem gay, afro boricua, que é igualmente um fiel católico. A convergência das minhas identidades que se intersetam origina questões profundas à medida em que medito na sabedoria de King e de Cooke e no tema deste tempo de reflexão e antecipação. Esta não é a primeira vez que refleti sobre isto. Há apenas alguns anos, ainda me questionava se podia ser simultaneamente uma pessoa de fé e viver de forma autêntica como homem abertamente gay.
Explorei as catedrais católicas, as igrejas rurais batistas das Caraíbas e as organizações evangélicas em busca de respostas. Decidi sobre o quanto de mim próprio precisava prescindir para ser amado por Deus e pelo Seu povo. Sobrevivi ao abuso espiritual e psicológico da terapia da conversão quando escolhi ficar em determinados espaços religiosos que não eram acolhedores das pessoas LGBTQ e acabei por perder família quando escolhi honrar a minha orientação sexual. Senti que não podia ganhar.
Angustiei-me enquanto esperava que Deus aparecesse com respostas à minha procura persistente pela verdade. É por isto que o Advento sempre ressoou profundamente em mim — porque me lembra desta longa jornada de um desejo ardente desesperado e expectativa por Deus.
O meu próprio desejo, procurando por Deus
Enquanto nesta peregrinação, acabei por acreditar que um Deus que me aceite completamente também afirma a total dignidade e humanidade de toda a comunidade LGBTQ, incluindo as pessoas LGBTQ de cor, num mundo e numa igreja que frequentemente não o faz. Cheguei a estas conclusões não somente através da oração e do estudo, mas também sendo testemunha das experiências vividas pelas pessoas LGBTQ de fé em todo o mundo que arriscaram as suas vidas para mostrar que de facto é possível viver na plenitude quem somos.
Testemunhei isto na minha amiga Alicia Crosby, que fundou a campanha Make Love Louder (Deixem o Amor Falar, numa tradução livre) para afogar quaisquer eventuais manifestantes anti-LGBTQ no Pride de Chicago, e nos muitos fiéis organizadores da LGBTQ Black Lives Matter que têm sido responsáveis num movimento renovado pela equidade e pela justiça. O Deus em que acredito, o Deus que se aproxima de nós neste tempo de Advento, exige justiça e equidade para quem é marginalizado, oprimido e desconsiderado.
Esta exploração de Deus e da fé levou-me a uma pergunta simples, persistente e assustadora: uma vez que Deus é um Deus que afirma a plena dignidade e humanidade das pessoas LGBTQ de cor como eu, o que farão as pessoas de fé?
Procurei respostas a esta pergunta quando trabalhei como ministro no campus da InterVarsity Christian Fellowship, uma organização evangélica que descobri não ser acolhedora para as pessoas LGBTQ. Procurei respostas enquanto estudante de teologia na Duke Divinity School e enquanto fundador dos Brave Commons, uma organização sem fins lucrativos com e em nome dos e das estudantes LGBTQ em colégios e universidades cristãos.
Aquilo que descobri é que as pessoas de fé por todo o mundo anseiam pela mudança que Cooke cantava e pela justiça que King, a partir das escrituras hebraicas, declarou que aconteceria.
Os responsáveis religiosos podem ajudar a justiça a avançar
Neste tempo de Advento, iniciei um novo papel como diretor religioso e de fé na Human Rights Campaign, a maior organização nacional defensora dos direitos civis das pessoas LGBTQ. Anseio colaborar com os responsáveis religiosos e decisores políticos pelo país para ajudá-los a que façam estas mesmas perguntas a si próprios, em busca do avanço da justiça e da equidade para a comunidade LGBTQ.
Acredito que com corações abertos e com vontade para escutar, os responsáveis religiosos e os decisores políticos que lutaram para serem aceites acabarão por chegar à conclusão inabalável de que as pessoas LGBTQ — particularmente as pessoas transgéneras de cor — são merecedoras de respeito e dignidade absolutos e das proteções abrangentes dos direitos civis que todas e todos merecemos.
Espero que, um dia, todas e todos os decisores políticos que possam utilizar a religião para rejeitar, excluir e afastar farão, em vez disso, tudo o que estiver ao seu alcance para garantir que todas as pessoas LGBTQ são protegidas da discriminação — refletindo o mandato divino de defender os direitos e a dignidade de todas as pessoas. Trabalhemos uns com os outros e outras até que a justiça caia como água e a retidão como uma corrente poderosa para toda a comunidade LGBTQ.
Enquanto esperamos e refletimos durante o tempo do Advento, olhando para a alegria do Natal, acredito firmemente que alcançaremos um mundo no qual as pessoas LGBTQ em todo o mundo são protegidas e prosperam e que as pessoas LGBTQ de fé são capazes de sentir a alegria de viver todos os aspetos das suas identidades. Acredito que uma mudança virá, de facto. Assim seja.
Fonte: USA Today